Publicado em: 10 de junho de 2025
Medida tem como objetivo firmar um entendimento único e obrigatório sobre o modelo de negócios da Buser, o que pode impactar o setor de transporte rodoviário de passageiros
ALEXANDRE PELEGI
Em 5 de junho de 2025, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu um passo decisivo na resolução da controvérsia jurídica em torno do modelo de “fretamento colaborativo”, popularizado por plataformas como a BUSER. Foi formalmente instaurado o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) de número 1019917-46.2025.4.01.0000. A medida, de competência da 3ª Seção do TRF1 e sob a relatoria do Desembargador Federal FLÁVIO JARDIM, tem como objetivo firmar um entendimento único e obrigatório sobre a matéria.
A Questão Central em Debate
O cerne do IRDR é definir se o modelo de negócios de fretamento de passageiros em “circuito aberto” permite legitimamente o transporte interestadual de passageiros. A análise se dará à luz das Resoluções da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) nº 4.770, de 25 de junho de 2015, e nº 4.777, de 6 de julho de 2015. A decisão terá um impacto direto na operação de plataformas e empresas que atuam com modelos semelhantes, além de buscar proporcionar segurança jurídica para todo o setor de transporte de passageiros.
Fundamentação e o Processo Paradigma
A instauração do incidente está baseada nos artigos 976 e 977 do Código de Processo Civil (CPC), que preveem essa medida quando há repetição de processos sobre a mesma questão de direito e risco de decisões conflitantes. Há diversos processos com essa questão jurídica em primeiro e segundo graus de jurisdição na Justiça Federal da 1ª Região, e existe uma possível divergência na interpretação das normas sobre a atuação de empresas de fretamento colaborativo no transporte rodoviário de passageiros.
O processo paradigma para a discussão é o de número 1067087-04.2022.4.01.3400, de relatoria do Desembargador Flávio Jardim. Este processo foi ajuizado pela Real Expresso contra a Buser Brasil Tecnologia, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo.
No processo original, a Real Expresso solicitou, em caráter liminar e no mérito, que a BUSER:
* Se abstenha de oferecer ou disponibilizar viagens que coincidam com suas linhas autorizadas.
* Se abstenha de prestar serviços de transporte rodoviário interestadual sem respeitar o “circuito fechado” e sem autorização individual da ANTT, sob pena de multa de R$ 100.000,00 por viagem.
* Tenha a paralisação total de sua plataforma (website e aplicativo) para coibir o transporte clandestino de passageiros.
A Real Expresso também pediu que a ANTT seja compelida a:
* Realizar fiscalização extensiva e diária para coibir o transporte clandestino da BUSER, sob pena de multa de R$ 100.000,00.
* Adotar medidas eficazes para a proibição total do transporte clandestino da BUSER, sob pena de multa de R$ 100.000,00.
Além disso, a ação busca o reconhecimento da ilegalidade dos serviços prestados pela Buser e a condenação da empresa ao pagamento de indenização por lucros cessantes à Real Expresso.
Próximos Passos e Partes Envolvidas
O Desembargador Federal Flávio Jardim, que possui legitimidade para solicitar a instauração do IRDR como relator de processos com a questão controvertida, solicitou a suspensão dos processos individuais ou coletivos sobre o tema, caso o IRDR seja admitido. Para o debate, será permitida a manifestação de órgãos e entidades interessadas, incluindo:
* Associação Brasileira dos Fretadores Colaborativos – Abrafrec.
* Associação Nacional dos Transportadores de Turismo e Fretamento.
* Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros – Abrati.
* Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
* Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda.
* Secretaria Nacional de Transporte Rodoviário do Ministério dos Transportes.
* Ministério Público Federal (que já figura como fiscal da lei no processo).
É importante notar que, até o momento, não foi identificado recurso ou processo paradigma repetitivo de controvérsia afetado como repercussão geral no Supremo Tribunal Federal (STF) ou repetitivo no Superior Tribunal de Justiça (STJ), nem Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) ou outro IRDR sobre a presente questão no próprio TRF1. A instauração deste IRDR sinaliza uma busca por pacificação e integridade jurisdicional diante da complexidade do tema.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes