Publicado em: 9 de setembro de 2025
Estudo aponta que, mesmo com salto de 85% nas vendas de veículos eletrificados em 2024, o país ainda não definiu metas claras para o transporte coletivo sustentável
ALEXANDRE PELEGI
O novo White Paper(*) sobre Mobilidade Elétrica, elaborado pela consultoria Thymos Energia, traça um panorama internacional da transição energética no transporte e alerta para o risco de o Brasil não acompanhar a tendência. O documento abrange todos os tipos de veículos eletrificados — automóveis, caminhões, motos, bicicletas — mas, por uma escolha editorial, este texto se concentra no transporte coletivo urbano por ônibus, setor em que os impactos ambientais e sociais da eletrificação são mais imediatos.
Cenário global
O estudo mostra que, em 2023, foram vendidos quase 50 mil ônibus elétricos no mundo, representando 3% das novas unidades. O estoque global atingiu 635 mil veículos, sendo a China responsável por cerca de 60% das vendas, reflexo de uma política iniciada ainda na década passada. “Cada ônibus elétrico em operação pode substituir centenas de automóveis individuais e evitar toneladas de CO₂ ao longo de sua vida útil, tornando-se uma política prioritária para cidades que buscam cumprir metas do Acordo de Paris”, destaca o documento.
A Agência Internacional de Energia (IEA) projeta que, até 2035, 30% dos ônibus vendidos globalmente deverão ser elétricos, considerando apenas as políticas atuais. Esse percentual pode ser ainda maior em cenários de compromissos mais ambiciosos de descarbonização.
Benefícios diretos
O white paper reforça que os ônibus elétricos não apenas eliminam emissões locais de poluentes como também reduzem significativamente o ruído urbano, aumentando o conforto para passageiros e comunidades. “O transporte coletivo eletrificado é um dos meios mais eficazes para reduzir emissões no curto prazo, já que substitui milhares de viagens individuais”, cita o estudo.
Além disso, o documento enfatiza que a confiabilidade e a eficiência da operação desses veículos dependem diretamente das tecnologias embarcadas e de gestão. Entre elas estão as baterias de lítio-ferro-fosfato (LFP) e níquel-manganês-cobalto (NMC), que determinam autonomia e segurança; a infraestrutura de recarga inteligente, como carregadores rápidos e pantógrafos automáticos instalados em pátios e terminais; e a integração com a rede elétrica, que viabiliza soluções de smart charging e o uso de fontes renováveis, como a energia solar.
Outro ponto crucial são os sistemas de telemetria, inteligência artificial e gestão de frotas, que monitoram em tempo real o desempenho dos veículos, previnem falhas e otimizam rotas. Esses recursos, combinados a plataformas digitais como o Mobility as a Service (MaaS), permitem que o transporte coletivo elétrico se integre de forma eficiente a outros modais, atendendo melhor às necessidades das cidades.
Desafios e gargalos no Brasil
Apesar do avanço global, o documento aponta que o Brasil ainda não aproveita seu potencial. “O país é o oitavo maior fabricante de veículos do mundo e o quarto maior mercado consumidor, mas menos de 7% dos licenciamentos em 2024 foram de elétricos”, observa o relatório. No transporte coletivo, a situação é ainda mais crítica: não existem metas nacionais de eletrificação da frota de ônibus, e políticas locais surgem de forma fragmentada.
Entre os principais gargalos listados pelo estudo estão:
Alto custo inicial dos veículos e baterias, ainda pouco compensado por políticas de subsídio;
Infraestrutura de recarga insuficiente, especialmente fora dos grandes centros;
Baixa nacionalização de componentes estratégicos, como baterias e motores;
Déficit de mão de obra qualificada para manutenção de ônibus elétricos;
Ausência de incentivos diretos ao consumidor e aos operadores de transporte público.
Conclusão do estudo
Para a Thymos Energia, o Brasil está em um ponto de inflexão. “Sem ação decisiva em regulação, infraestrutura e estímulo à produção local, o país pode comprometer a competitividade da sua indústria e perder os benefícios econômicos e ambientais da eletromobilidade”, conclui o white paper.
A consultoria é enfática: “Há risco de o Brasil perder o bonde da eletrificação”, em especial no transporte coletivo, onde os ganhos sociais, ambientais e de saúde pública são mais evidentes.
Principais números da eletrificação dos ônibus
50 mil ônibus elétricos vendidos no mundo em 2023 (3% das vendas anuais).
635 mil ônibus elétricos em circulação global.
60% das vendas concentradas na China.
30%: participação projetada dos ônibus elétricos nas vendas globais até 2035 (cenário atual da IEA).
85%: crescimento das vendas de veículos eletrificados no Brasil em 2024, mas menos de 7% dos licenciamentos foram elétricos.
(*) white paper – é um documento técnico ou analítico, geralmente elaborado por especialistas, que apresenta de forma aprofundada informações, diagnósticos e propostas sobre um tema específico. Seu objetivo é orientar decisões, embasar políticas ou apontar caminhos estratégicos, combinando dados, tendências e recomendações.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes