Publicado em: 17 de novembro de 2025

Declarações são do presidente do Grupo JCA, Gustavo Rodrigues, ao repórter Adamo Bazani, do *Diário do Transporte*, que ainda disse que joint-venture aguarda liberação do CADE para os mercados do eixo Rio-São Paulo. Por enquanto, duas marcas continuam
ADAMO BAZANI
Colaborou Vinícius de Oliveira
“Clanditech”: o termo empregado entre os operadores regulares de transportes rodoviários de passageiros ainda é pouco conhecido da população em geral, mas tem servido, na visão destes empresários, para apelidar o que consideram “transporte clandestino na mais pura concepção”, mas sob nova roupagem: as dos aplicativos de ônibus “de turismo” que utilizam como “parceiras” empresas de fretamento para fazerem linhas regulares sem autorização para isso.
As chamadas “stratups” refutam o rótulo e dizem que não são ilegais, que não há proibição de suas atividades e que se enquadrariam no chamado princípio do “livre-mercado”, previsto na Constituição. O tema é polêmico, e nos tribunais, há decisões favoráveis e contrárias. O mercado como um todo (os aplicativos, empresas de fretamento e empresas de linhas regulares) aguardam tanto uma definição pelo Congresso Nacional e de um julgamento pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para deixar de vez por todas, claro o assunto.
Já de conhecimento de parte dos passageiros, os aplicativos de ônibus, que se denominam como “plataformas de fretamento colaborativo”, permitem que cada usuário compre sua viagem, individualmente, em rotas ofertadas ou que podem ser criadas por meio da demanda que aparecer. O exemplo mais conhecido deste tipo de serviço é o oferecido pela Buser, que possui um capital gigantesco e é anunciante de grandes e caras mídias de TVs, rádios e portais/jornais tradicionais.
Apesar de discursos institucionais, principalmente por associações de empresas regulares, como a Abrati, contra o chamado fretamento no “circuito aberto”, poucos gestores têm se pronunciado clara e abertamente sobre o tema, com exemplos práticos de como o setor tem se organizado.
Um deles que resolveu deixar clara a visão deste segmento é o presidente do Grupo JCA, Gustavo Rodrigues, em entrevista exclusiva ao repórter e editor-chefe do Diário do Transporte, Adamo Bazani, nesta segunda-feira, 17 de novembro de 2025.
A entrevista aconteceu na sede da Scania, em São Bernardo do Campo (SP), onde o Grupo anunciou, juntamente com a montadora e com a fabricante de carrocerias Marcopolo, o encerramento do ciclo de investimentos de 650 ônibus 0 km comprados e a projeção do Grupo para a partir de 2026 iniciar um novo ciclo com cerca de mais 300 unidades, que podem ser de diferentes marcas e configurações.
Relembre:
O executivo também falou sobre a BusCo, uma joint venture entre o Grupo JCA e o Grupo Águia Branca (outra gigante do setor rodoviário), que oferece também por meio de aplicativos viagens de ônibus rodoviários de menor custo, mas por empresas de linhas regulares.
Gustavo Rodrigues destacou que a BusCo é um exemplo claro de resposta do setor rodoviário regular contra o avanço do que chama de “clanditech” e ainda falou do futuro das plataformas próprias do Grupo JCA (a wemobi) e da Águia Branca (a ÁguiaFlex).
Segundo o gestor, a BusCo já está absorvendo e vai continuar neste processo, as operações da wemobi e da ÁguiaFlex, menos as do eixo Rio de Janeiro a São Paulo.
Neste caso, ambos grupos empresariais esperam uma autorização do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), do Ministério da Justiça, que vai dar o parecer sobre se a BusCo representa neste eixo concentração de mercado ou não.
Enquanto isso, as duas marcas continuam, tanto ÁguiaFlex como wemobi.
GLOSSÁRIO
Leia abaixo a entrevista na íntegra, mas a tempo, para quem não é familiarizado ao mercado rodoviário:
– Circuito Aberto x Circuito Fechado:
Circuito aberto é a operação hoje atribuída a empresas de linhas regulares, que saem de terminais oficiais, têm horários de partidas e rotas fixas independentemente se os ônibus saem muitos ou poucos passageiros e concede as gratuidades por lei, como para idosos, jovens de baixa renda e pessoas com deficiência. As passagens podem ser compradas por pessoas individualmente. Exemplo: um ônibus que sai da rodoviária do Tietê, em São Paulo, faz paradas em terminais no meio do caminho, e finaliza a viagem na rodoviária do Rio de Janeiro.
Circuito fechado é a operação por fretamento: o grupo de passageiros da ida é o grupo de passageiros da volta, não pode haver venda individual de passagens, nem embarques e desembarques no meio do caminho. Não concede gratuidades de, no caso dos aplicativos, se não tiver uma ocupação mínima (em torno de 40%, cancelam a viagem). Exemplo: um grupo de uma paróquia católica que aluga um ônibus para a Basílica de Nossa Senhora de Aparecida ou um grupo evangélico que quer conhecer o Templo de Salomão, da Igreja Universal do Reino de Deus, em São Paulo.
– A queixa das regulares: A queixa dos operadores de transportes regulares é que os aplicativos de ônibus e empresas de fretamento querem vender passagens e fazer as linhas, mas sem obedecer às regras: como cumprir viagens com ônibus quase vazios; seguir horários fixos, pagar taxas de rodoviárias, conceder gratuidades e “degustar o filé” das linhas, mas sem “roer o osso” das linhas menos rentáveis, o que causaria um desequilíbrio que prejudicaria os menos favorecidos e as linhas de maior apelo social. Por exemplo: um São Paulo x Rio de Janeiro, todo mundo quer fazer, inclusive os aplicativos. Mas sobra para o regular operar, por exemplo, de Rodelas, Cairu e Coronel João Sá, no sertão da Bahia, com mais de 90% da população vivendo em situação de pobreza e extrema pobreza, de acordo com dados de 2022 do Cadastro Único, para cidades também com altas carências de Sergipe como Tomar do Geru, Brejo Grande, Capela, Poço Redondo e Siriri. O “lucro de uma Rio de Janeiro x São Paulo da vida” bancaria uma operação de caráter social entre estes extremos, por exemplo. Se cai a demanda na linha lucrativa, logo, a mais carente é a que sente. Além disso, se da um problema com bagagem ou acidente na viagem, a empresa regular é responsabilizada, mas se isso acontece com o aplicativo, fica aquele empurra-empurra: quem vai “segurar o B.O.” e se responsabilizar: o app ou a empresa de fretamento? Embora que decisões judiciais sobre o tema entendem que haja uma responsabilidade solidária, ou seja, ambas (mas isso só depois de muita luta na Justiça).
Grupo JCA: Mesmo quem nunca ouviu falar em JCA, certamente conhece alguma empresa que o forma. O Grupo JCA reúne companhias gigantes como Viação Cometa, Auto Viação 1001, Autoviação Catarinense, Rápido Ribeirão Preto, Expresso do Sul, Macaense, entre outras.
O Diário do Transporte procurou os representantes das empresas de aplicativo.
ENTREVISTA:
ADAMO BAZANI: O Diário do Transporte conversa com o CEO e presidente do Grupo JCA, Gustavo Rodrigues, que vai esclarecer alguns pontos importantes para a gente, que surgem algumas dúvidas em relação ao mercado, sobre a BusCo. Você falou aqui em sua explanação sobre o contexto dos ônibus rodoviários, do mercado rodoviário, que a BusCo está absorvendo operações da Águia Flex, que é do Grupo Águia Branca, e da wemobi, que é do Grupo JCA. O objetivo futuro vai ser substituir a Águia Flex e a wemobi somente por BusCo, é isso?
GUSTAVO RODRIGUES: Obrigado pela pergunta. Como eu mencionei na entrevista, a BusCo se tornou operacional, depois de passar pelo processo de autorização do CADE [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] e as operações que até então vinham sendo realizadas pela wemobi e pela Águia Flex de linhas que não estão relacionadas ao mercado Rio-São Paulo, no qual houve a restrição, essas operações sim foram migradas, houve o tombamento dessas operações para a experiência BusCo e venda através da plataforma BusCo e das próprias plataformas Águia Flex e wemobi como canal de vendas para a BusCo. Isso já aconteceu e ao longo do próximo ano a BusCo vai continuar agora procurando explorar outras rotas, aumentar a oferta de horários nessas rotas, que é um produto específico. Ele tem um viés de atender um público, de recuperar um público, que eu mencionei na nossa entrevista, que foi ao longo dos últimos anos seduzido por ofertas que não espelham o compromisso que os nossos grupos, tanto Águia Branca quanto o JCA como operadores, têm com a segurança.
ADAMO BAZANI: Perfeito. Mas as marcas Águia Flex e wemobi, com o tempo elas vão desaparecer?
GUSTAVO RODRIGUES: Enquanto o CADE não autorizar a operação da Rio-São Paulo, essas marcas vão continuar oferecendo a experiência wemobi e a experiência Águia Flex no mercado Rio-São Paulo. A gente tem no momento essa restrição. Se houver a flexibilização, uma melhor compreensão por parte do CAD da importância dessa iniciativa, a BusCo, sim, deverá receber essas operações no futuro, assim que for autorizado.
ADAMO BAZANI: Perfeito. Você falou também a respeito da realidade do mercado rodoviário sobre, até um termo que você usou, Clanditech. Esse movimento da BusCo, inicialmente também pela Águia Flex, pela wemobi, outras empresas regulares estão fazendo também algo semelhante, já está revertendo essa questão da concorrência com os ônibus de aplicativos não regulares e que querem operar como regulares?
GUSTAVO RODRIGUES: Olha, o objetivo destas ofertas é exatamente oferecer o que está na essência dos transportadores de linhas regulares, que é a segurança, e dialogar com esse público através de canais de comunicação, uma forma de se comunicar diferente, uma marca diferente. Dentro da realidade dos grupos, nós enxergamos essas ofertas como produtos, que estão ali buscando trazer de volta para o serviço público regular esses clientes que migraram eventualmente para essas operações que eu mencionei aqui. Não é um termo que foi criado por mim, nós do setor carinhosamente batizamos de Clandtechs, clandestinos tecnológicos que não fazem nada diferente do que os clandestinos fizeram durante toda a vida. Isso é um mal que aflige o nosso setor há décadas e a gente faz o esforço necessário para que a fiscalização das agências reguladoras e do Poder Público consiga efetivamente combater essas ofertas, porque elas não oferecem a segurança que o cidadão merece.
ADAMO BAZANI: Perfeito, Gustavo, a gente agradece bastante a sua participação no Diário do Transporte e acredita que tem esclarecido várias dúvidas em relação ao mercado, em relação à atuação dessa nova joint-venture.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
Colaborou Vinícius de Oliveira


