Publicado em: 29 de novembro de 2025

Em audiência na quarta-feira (26) agência mostrou que 81% dos 70 mil pedidos serão aprovados sem disputa, levando a malha a 75 mil mercados atendidos, com inclusão de 800 cidades, fim de 10 mil monopólios e definição dos resultados já em janeiro de 2026
ALEXANDRE PELEGI
Durante audiência pública realizada nesta quarta-feira, 26 de novembro de 2025, no Ministério Público Federal (MPF), a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) apresentou, pela primeira vez, o tamanho real da Janela Extraordinária nº 1/2024. Os dados, divulgados pelo superintendente Juliano Samôr, mostram que o processo vai redesenhar de forma profunda o transporte rodoviário interestadual de passageiros.
Para analisar os impactos e a relevância dessa abertura de mercado, o Diário do Transporte ouviu o especialista Ilo Löbel da Luz, um dos nomes mais atentos ao movimento regulatório do setor. Ele classificou os números como “históricos” e reforçou:
“A era da exclusividade está chegando ao fim. A vantagem competitiva agora se desloca para eficiência, densidade operacional e qualidade do serviço. O mercado vai premiar quem entrega, não quem bloqueia.”
Segundo os dados apresentados pela ANTT, dos 70 mil pedidos protocolados pelas empresas, focados majoritariamente em mercados hoje desassistidos ou monopolizados, 57 mil serão aprovados diretamente — ou seja, 81% da janela não terá disputa. Apenas 15% (cerca de 12 mil mercados) irão para processo seletivo.
Com isso, a malha interestadual saltará para 75 mil mercados atendidos. Para Ilo Löbel da Luz, trata-se de “uma inversão completa do modelo anterior”:
“A agência finalmente reconhece o tamanho da demanda reprimida e responde a ela. O sistema deixa de ser restritivo para ser inclusivo. É a maior reconfiguração de oferta desde a criação da ANTT.”
A expansão atinge dimensões sociais relevantes. De acordo com os números apresentados:
- 800 cidades que hoje não têm nenhuma ligação interestadual serão finalmente atendidas.
- 10 mil mercados monopolizados ganharão um concorrente, saltando de 1 para 2 operadores.
- 35 mil mercados desatendidos passarão a receber ao menos uma empresa.
Löbel da Luz chama atenção para o ganho de capilaridade:
“O transporte interestadual volta a cumprir seu papel de integração regional. Municípios inteiros, hoje isolados, vão reencontrar o mapa do serviço público.”
Expansão desigual, mas previsível
O crescimento não ocorre de forma homogênea. Nordeste e Sudeste lideram com 31% cada dos novos mercados, seguidos por Centro-Oeste (15%), Sul (12%) e Norte (10%).
Segundo Ilo Löbel da Luz, a distribuição reflete o “vazio histórico” deixado pelas estruturas anteriores:
“São regiões onde, por décadas, a política de mercados restritos impediu a entrada de novos operadores. Era inevitável que a correção viesse com força.”
O contexto da audiência, segundo o especialista, não é mero detalhe. A presença da FlixBus e de outros novos entrantes no MPF elevou a pressão institucional.
“A ANTT precisava se posicionar. A apresentação dos dados no MPF é um recado: a janela vai continuar, e ela é a resposta regulatória para pacificar o ambiente judicial. O caminho político está traçado.”
Löbel da Luz avalia ainda que a exposição busca dar previsibilidade:
“O setor estava em ebulição. As empresas precisavam de clareza. A agência deu um passo transparente — e isso muda o humor do mercado.”
Cronograma: o relógio começa a correr
De acordo com o Comunicado de Abertura, os próximos passos são imediatos:
- Envio das GRUs (R$ 150 por mercado): previsto para dezembro.
- Prazo de pagamento: 5 dias úteis após o recebimento.
- Resultado final: janeiro de 2026, com definição dos mercados concedidos diretamente e dos que irão a processo seletivo.
Para Ilo Löbel da Luz, o curto prazo é intencional:
“A ANTT quer resolver a janela rápido, antes do acúmulo de novas demandas e judicializações. A ordem é destravar.”
Fim da exclusividade
Para as operadoras tradicionais, o recado é direto. O especialista resume:
“O que sustentou o setor por anos — a exclusividade de mercado — acabou. Agora, sobrevive quem tem estrutura instalada, frota dimensionada, leitura de demanda e eficiência. Não existe mais a proteção regulatória.”
Ele reforça que a competição tende a se intensificar:
“Os mercados mais atrativos vão ganhar novos entrantes. E os desatendidos terão, pela primeira vez, cobertura. É um novo ciclo.”
A Janela Extraordinária dá início a uma guinada histórica: amplia oferta, rompe monopólios, insere cidades no mapa, cria concorrência e redefine a lógica estratégica das empresas. A audiência no MPF mostrou que a ANTT escolheu o caminho da abertura — e os números colocados à mesa confirmam que a mudança não é gradual, mas estrutural.
Como afirma Ilo Löbel da Luz:
“O setor vai mudar porque já mudou. Quem entender isso primeiro, sai na frente.”
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes


