Publicado em: 12 de novembro de 2025

Painel reuniu Gilson Santos, da AMEP, o consultor Sérgio Avelleda e o vice-presidente da ANTP, Cláudio de Senna Frederico, para discutir o BUD – Bonde Urbano Digital, modal elétrico sobre pneus que o Paraná testará em corredor de 10 km entre Piraquara e Pinhais
ALEXANDRE PELEGI
“O BUD é um projeto para seduzir o passageiro e dar orgulho a quem usa o coletivo.”
A frase do consultor Sérgio Avelleda, ex-secretário de Transportes da cidade de São Paulo, marcou o tom do painel que discutiu o Bonde Urbano Digital (BUD) — novo veículo elétrico sobre pneus desenvolvido pela chinesa CRRC — durante a Arena ANTP 2025, em São Paulo.
O debate destacou o potencial do modal para revalorizar o transporte público, aliando sustentabilidade, conforto e imagem positiva. O Governo do Paraná será o primeiro a testar o sistema em um corredor de 10 quilômetros entre Piraquara e Pinhais, com trecho autônomo e guiagem magnética no asfalto.
Gilson Santos: “Um projeto embrionário e simbólico”
O presidente da Agência de Assuntos Metropolitanos do Paraná (AMEP), Gilson Santos, apresentou o projeto como um marco pioneiro para o Estado e para o país. “É um veículo inovador, uma junção do ônibus com o VLT. Tem a capacidade de um trem leve e a versatilidade de um ônibus”, disse.
Segundo ele, o custo de implantação é cerca de um terço do valor de um VLT tradicional, com prazo menor e menos impacto de obras. “Não precisa de trilhos nem de segregação total da via, o que reduz custos e acelera o cronograma”, afirmou.
O projeto-piloto será implantado em uma linha de 10 km, com terminal e oficina em Piraquara e cooperação de universidades para avaliação independente. “Piraquara tem 98% do território em área de manancial e fornece 85% da água de Curitiba. Queremos conciliar inovação e preservação ambiental”, completou.
Avelleda: “Projeto para seduzir o passageiro e dar orgulho a quem usa o coletivo”
Para Sérgio Avelleda, o BUD representa uma oportunidade de reconquistar a confiança do público e mudar a percepção sobre o transporte coletivo. “O BUD junta a flexibilidade do ônibus à atratividade do VLT. É rápido de implantar e, sobretudo, um projeto para seduzir o passageiro e dar orgulho a quem usa o coletivo.”
O consultor criticou a falta de estratégia de comunicação no setor: “Acabou o tempo do usuário cair por gravidade. Nós não comunicamos o transporte público. Nenhum centavo é gasto para mostrar que andar de ônibus é bom. É preciso mostrar que o coletivo é moderno, limpo e eficiente.”
Aveleda também destacou a importância de criar identidade e pertencimento para os sistemas. “Curitiba tem o Expresso, Bogotá o Transmilênio, Cidade do México o Metrobus. Isso cria cultura e orgulho. O transporte precisa ser visto como parte do cotidiano urbano, não como castigo.”
O especialista lembrou ainda que o BUD reduz riscos operacionais e aumenta a resiliência das redes. “Um modal sobre pneus contorna obstáculos e mantém o serviço. Em cidades com alagamentos e manifestações, isso é uma vantagem enorme. E é um sistema que entrega resultado rápido — obra que entrega rápido conquista o cidadão.”
Cláudio de Senna Frederico: “O que importa é o passageiro dizer ‘quero mais’”
O ex-secretário de Transportes Metropolitanos de São Paulo, Cláudio de Senna Frederico, atual vice-presidente da ANTP, afirmou que o êxito do projeto depende da aceitação do passageiro e da qualidade percebida do serviço. “É irrelevante discutir se é ônibus ou bonde. O que importa é o passageiro dizer, no dia seguinte, ‘quero mais’. É isso que mede o sucesso de qualquer sistema.”
Frederico destacou que o BUD tem base ferroviária, o que o torna mais robusto e com vida útil até três vezes maior que a de um ônibus convencional. “Por seguir normas ferroviárias, o veículo é mais durável e oferece conforto superior.”
Ele alertou, no entanto, que o modal precisa de condições adequadas de operação. “Veículo moderno parado em congestionamento é fracasso anunciado. O BUD precisa de corredor exclusivo e operação de classe A. O metrô mostrou isso: lugar público limpo e bem cuidado é símbolo de respeito.”
Frederico sugeriu que São Paulo poderia ser uma vitrine para o novo modal. “O Expresso Tiradentes (ex-Fura-Fila) é o local ideal para testes. Tem infraestrutura e permitiria operação automática tipo ATO. Seria uma vitrine nacional.”
Gilson Santos: “É uma inversão de valores necessária”
Na etapa final do painel, Gilson Santos criticou o contraste entre os investimentos destinados ao transporte individual e os aplicados no coletivo. “Quando o poder público investe milhões em um viaduto, ninguém questiona. Mas quando é para o transporte coletivo, sempre perguntam se é caro. Precisamos inverter essa lógica.”
Ele lembrou que o sistema metropolitano de Curitiba transporta 400 mil passageiros por dia com tarifa social de R$ 5,50, subsidiada pelo Estado. “Cada real investido no coletivo retorna em qualidade de vida e sustentabilidade. O BUD é mais uma ferramenta para reencantar o cidadão e valorizar o transporte público.”
Mobilidade integrada e olhar para o futuro
Encerrando o painel, Paulo Benites destacou que o BUD se soma aos demais modais no desafio de modernizar o transporte coletivo brasileiro. “O BUD não é concorrente do VLT, do BRT ou do ônibus elétrico. São tecnologias complementares. A mobilidade do futuro é multimodal, limpa e conectada, e o Paraná mostra que é possível inovar com responsabilidade.”
Os testes do BUD devem começar nas próximas semanas, com monitoramento técnico independente e participação de operadores locais. Caso os resultados confirmem o desempenho esperado, o modelo poderá avançar para Curitiba e inspirar novos corredores urbanos no país.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes


