Publicado em: 16 de outubro de 2025
Apelação contesta a Deliberação nº 335/2025, que retirou autorizações operadas pela empresa; número de linhas cassadas foi ampliado posteriormente para 27 pela Deliberação nº 376/2025
ALEXANDRE PELEGI
A Catedral (Kandango Transportes e Turismo Ltda) entrou com recurso na Justiça Federal pedindo a suspensão dos efeitos da decisão da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que cassou parte de suas autorizações de transporte interestadual. A empresa sustenta que a penalidade, imposta pela Deliberação nº 335/2025, é desproporcional e contraria parecer técnico interno da própria agência, que recomendava apenas advertência.
O processo foi distribuído ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) e busca reverter a cassação dos mercados determinada pela ANTT, medida que, segundo a defesa, ameaça a continuidade das operações da empresa e gera impacto direto no atendimento aos passageiros.
Empresa alega nulidade da sentença e risco de falência
Na petição assinada pelos advogados César Cintra Jatahy Fonseca Filho e Lucas Daltro Jatahy Fonseca, a defesa sustenta que o juízo de primeira instância indeferiu a inicial sem oportunizar a emenda da peça processual, o que configuraria violação aos princípios do contraditório e da vedação à decisão surpresa, conforme os artigos 317 e 321 do Código de Processo Civil.
O recurso também enfatiza o “risco iminente de perecimento do direito”, uma vez que a manutenção da cassação representaria “a inviabilização completa das atividades da empresa, com risco de falência de uma operadora com mais de 30 anos de mercado, 242 ônibus e capital social superior a R$ 25 milhões”.
Segundo a petição, os mercados cassados correspondem a cerca de 50% do faturamento da Catedral, e a medida obrigaria a empresa a reembolsar centenas de passagens vendidas antecipadamente, gerando prejuízos também a consumidores e comprometendo a concorrência no transporte interestadual.
Cassação contrariou parecer técnico interno da ANTT
De acordo com os autos, a Deliberação nº 335/2025 contrariou o relatório final da Comissão de Processo Administrativo (CPA) da própria ANTT, que havia recomendado apenas advertência após reconhecer a “superveniente aderência da empresa às normas e à correção de irregularidades no envio de dados ao sistema MONITRIIP”.
A CPA ponderou, com base na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), que “uma medida mais drástica poderia causar grave impacto ao mercado regulado”, defendendo a proporcionalidade e a continuidade do serviço público.
Mesmo assim, a Diretoria Colegiada decidiu pela cassação dos seis mercados operados pela Catedral, medida considerada “flagrantemente desproporcional” pela defesa.
Deliberação posterior ampliou o alcance da penalidade
O caso ganhou novos desdobramentos em 9 de outubro de 2025, quando a ANTT publicou a Deliberação nº 376, ampliando o número de linhas cassadas e estendendo os efeitos da penalidade para 27 mercados interestaduais operados pela Catedral/Kandango.
Conforme reportagem publicada pelo Diário do Transporte, a nova deliberação corrigiu omissão da Deliberação nº 335, deixando claro que a perda de validade se estendia também aos Termos de Autorização (TARs) vinculados aos mercados cassados. Relembre:
ANTT amplia cassação de mercados operados pela Catedral e estende sanção a 27 linhas interestaduais
Entre as rotas atingidas estão Barreiras–Brasília, Goiânia–São Paulo, Goiânia–Palmas, Brasília–Goiânia e Uberlândia–Teresina, além de outros mercados tradicionais explorados pela empresa.
O embasamento jurídico da ampliação está nos artigos 78-A e 78-H da Lei nº 10.233/2001, que tratam da cassação de autorizações por infrações graves e definem o rito administrativo aplicável.
Ainda segundo a ANTT, a medida foi mantida pela Justiça Federal após constatação de envio de informações falsas ao sistema MONITRIIP, com divergência entre dados transmitidos e fiscalizações de campo.
“A empresa autora estava alimentando o MONITRIIP com dados fictícios, pois informava a operação de determinadas linhas, mas a fiscalização encontrava os veículos em outras localidades, com motoristas diferentes dos declarados”, afirmou o juiz federal substituto Márcio de França Moreira.
“A decisão administrativa limitou seus efeitos tão somente à cassação dos mercados onde as ocorrências mais graves foram flagradas e onde a fraude na apresentação das informações foi verificada in loco pela fiscalização da ANTT, tornando-as, portanto, indenes de dúvida”, completou o magistrado.
A sentença, proferida em 22 de setembro de 2025, confirmou a validade da cassação aplicada pela agência. Relembre:
Justiça Federal confirma cassação de mercados da Catedral por fraude em dados operacionais
Entenda o caso
O conflito teve início em setembro de 2023, quando a Expresso Guanabara protocolou denúncia na ANTT por supostas “não conformidades operacionais” e “fraudes no MONITRIIP”, sistema eletrônico de monitoramento de viagens interestaduais.
A partir disso, a ANTT editou a Portaria SUFIS nº 62/2023, suspendendo as atividades da empresa — decisão posteriormente revogada pela própria agência em maio de 2024, após reconhecer a regularização das pendências técnicas por parte da Catedral (Portaria SUFIS nº 55/2024).
Apesar da revogação, o processo administrativo seguiu e resultou na Deliberação nº 335/2025 — ato que a Catedral tenta agora anular por via judicial.
Próximos passos
O pedido de tutela antecipada com efeito suspensivo foi distribuído ao desembargador federal Hércules Fajoses, da 5ª Turma do TRF-1.
Caso o relator conceda a liminar, os efeitos da cassação da ANTT ficarão suspensos até o julgamento do mérito da apelação. A agência deverá ser intimada para apresentar manifestação.
Mercados cassados pela Deliberação nº 335, de 11 de setembro de 2025, decisão que a Catedral contesta:
1. Barreiras/BA – Brasília/DF, constantes do TAR nº BAGO0053051 (Decisão Supas nº 2.398/2024) e RNSP0053041 (Decisão Supas nº 2.381/2024);
2. Brasília/DF – Teresina/PI, constante do TAR nº DFPI0053015 (Decisão Supas nº 2.368/2024);
3. Goiânia/GO – Palmas/TO, constante do TAR nº GOTO0053044 (Decisão Supas nº 2.379/2024);
4. Uberlândia/MG – Teresina/PI, mercado sem TAR emitido;
5. Goiânia/GO – São Paulo/SP, constantes dos TARs nº RNSP0053046 (Decisão Supas nº 2.387/2024) e RNSP0053041 (Decisão Supas nº 2.381/2024);
6. Brasília/DF – Goiânia/GO, constante do TAR nº BAGO0053052 (Decisão Supas nº 2.401/2024).
Rotas afetadas pela cassação ampliada da Catedral, conforme Deliberação nº 376/2025, de 09 de outubro:
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº BADF0053048
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº BAGO0053051
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº DFPI0053015
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº GOPI0053027
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº GORN0053034
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº MGPI0053023
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Barreiras (BA) – Brasília (DF), TAR nº RNSP0053041
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Brasília (DF) – Teresina (PI), TAR nº DFPI0053015
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Brasília (DF) – Teresina (PI), TAR nº MGPI0053023
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Goiânia (GO) – Palmas (TO), TAR nº GOTO0053017
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Goiânia (GO) – Palmas (TO), TAR nº GOTO0053044
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Uberlândia (MG) – Teresina (PI), TAR nº MGPI0053023
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Goiânia (GO) – São Paulo (SP), TAR nº DFSP0053055
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Goiânia (GO) – São Paulo (SP), TAR nº GOSP0053028
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Goiânia (GO) – São Paulo (SP), TAR nº RNSP0053041
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Goiânia (GO) – São Paulo (SP), TAR nº RNSP0053046
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº BAGO0053051
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº BAGO0053052
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº DFGO0053049
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº DFSP0053055
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº GOBA0053025
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº GOPI0053027
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº GORN0053033
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº GORN0053034
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº MGPI0053023
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº RNSP0053041
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Brasília (DF) – Goiânia (GO), TAR nº RNSP0053046
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes