Publicado em: 30 de julho de 2025
Liminares concedidas afastam a “janela extraordinária de mercados” e artigos da Resolução nº 6.033/2023, reforçando tese da livre concorrência no setor de transporte terrestre
ALEXANDRE PELEGI
A 4ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal deferiu, em caráter liminar, dois mandados de segurança que contestavam as regras da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para a concessão de autorizações no transporte interestadual de passageiros.
As decisões beneficiam as empresas Evolução e Era Transporte e Turismo, que buscavam o regular processamento de seus pedidos de emissão de Termo de Autorização (TAR) sem a necessidade de se submeterem à denominada “janela extraordinária de mercados” ou à aplicação de artigos restritivos da Resolução ANTT nº 6.033/2023, que definiu o Novo Marco Regulatório do TRIIP.
As empresas, representadas pelo advogado Edmo Rodrigues Araujo, sustentaram que a exigência de submissão à janela de abertura e a limitação do número de autorizações configuram uma restrição indevida ao regime jurídico estabelecido pelo art. 47-B da Lei nº 10.233/2001. Este artigo estabelece que “não haverá limite para o número de autorizações […] salvo no caso de inviabilidade técnica, operacional e econômica”.
As empresas argumentaram que a ANTT não declarou inviabilidade técnica ou econômica para os mercados pretendidos, tornando a restrição imposta carente de fundamento legal.
A Era Transporte e Turismo, em seu mandado de segurança, também citou o Acórdão TCU nº 230/2023 e o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI nº 5549 para reforçar a tese da inexistência de limites de autorizações, salvo nas exceções legais. A jurisprudência do STF na ADI 5549 firmou que a atuação regulatória da ANTT deve respeitar os princípios da livre concorrência e da legalidade estrita, sendo vedadas limitações não previstas expressamente em lei.
Ao analisar os pedidos, o juízo da 4ª Vara Federal Cível da SJDF vislumbrou a presença simultânea dos requisitos para a concessão de medida liminar: o fundamento relevante (fumus boni iuris) e o risco de ineficácia da medida (periculum in mora).
As decisões destacaram que a submissão compulsória a uma “janela de abertura” decorre de um ato normativo infralegal (Resolução nº 6.033/2023), que, à primeira vista, aparenta extrapolar o poder regulamentar da ANTT, afrontando a legislação federal e os princípios da livre concorrência e da legalidade. Além disso, a negativa imotivada da autorização para operar mercados viáveis inviabiliza a expansão da atividade econômica das impetrantes, gerando perda de oportunidade, prejuízos financeiros e redução da concorrência em mercados relevantes, configurando o perigo de dano.
Ambas as decisões fizeram referência ao mandado de segurança nº 1026255-21.2025.4.01.3400, também em trâmite perante o mesmo Juízo, no qual medida liminar idêntica já havia sido deferida. Trata-se de decisão favorável à empresa Danistur. Essa decisão liminar, ao determinar a não observância das “janelas” por parte da agência, está impactando diretamente a sistemática de análise de pedidos que a ANTT havia estabelecido. Em suma, as transportadoras estão utilizando as negativas da ANTT como base para ir à Justiça e, invocando um precedente judicial, buscar a autorização de linhas fora do sistema de janelas regulamentado pela própria agência.
Como mostrou o Diário do Transporte, no dia 25 de março de 2025, portanto há três meses, a 4ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) acolheu o pleito da Danistur, concedendo uma liminar que reconheceu a plausibilidade do direito alegado pela empresa (fumus boni iuris). O juízo considerou que a imposição de restrições regulatórias genéricas a mercados viáveis representa um excesso do poder regulamentar da ANTT, desrespeitando a legislação federal e a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI nº 5549 e do Tribunal de Contas da União (TCU) no Acórdão TCU nº 230/2023, que vedam a limitação concorrencial em mercados viáveis como regra. Relembre:
Estratégia judicial de transportadoras desafia “Janelas de Abertura” da ANTT, revela Ilo Löbel da Luz ao Diário do Transporte
Com a concessão das novas liminares, o Superintendente de Serviços de Transporte de Passageiros da ANTT foi determinada a:
- Admitir e dar o regular processamento aos requerimentos formulados nos processos administrativos SEI nº 50505.039195/2025-31 (para EVOLUCAO TRANSPORTES) e ANTT nº 50505.039191/2025-53 (para ERA Transporte), nos termos do art. 17 da Resolução ANTT nº 6.033/2023.
- Abster-se de exigir a submissão à “janela extraordinária” como condição para a emissão do Termo de Autorização (TAR) e de aplicar os comandos dos arts. 15, §1º, 17, I, “a”, 54, §1º, e 57, §1º, II, da Resolução ANTT nº 6.033/2023, naquilo em que contrariem o art. 47-B da Lei nº 10.233/2001.
- A ANTT também deverá informar, no prazo legal, se algum dos mercados listados nos processos administrativos foi formalmente declarado inviável, com motivação técnica específica.
A ANTT e a autoridade coatora serão notificadas para prestar informações no prazo legal, e o Ministério Público Federal (MPF) será intimado para atuar como fiscal da lei.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes