Publicado em: 31 de dezembro de 2025

“O recado da ANTT é claro: acabou o improviso. Após anos operando com soluções provisórias, o setor passa a ser fiscalizado com base em dados estruturados e auditáveis”, diz Ilo Löbel
ALEXANDRE PELEGI
A atualização das regras do Sistema de Monitoramento do Transporte Rodoviário Coletivo Interestadual e Internacional de Passageiros (MONITRIIP), publicada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) no último dia útil de 2025, sinaliza uma mudança estrutural na forma como o transporte rodoviário interestadual de passageiros será fiscalizado e regulado a partir de 2026. Com a entrada em vigor da versão 4.0 do Documento de Interface de Software (DIS), a Agência amplia o rigor sobre a coleta, a validação e o cruzamento de dados operacionais das empresas.
Para o especialista em transporte rodoviário Ilo Löbel da Luz, a nova portaria encerra definitivamente o período de improviso regulatório vivido pelo setor nos últimos anos. Segundo ele, a exigência de integração digital, criptografia e transmissão padronizada de informações transforma a tecnologia em um requisito básico de operação, e não mais em diferencial competitivo.
“O recado da ANTT é claro: acabou o improviso. O setor passou anos operando com soluções provisórias, mas agora a fiscalização passa a ser orientada por dados estruturados e auditáveis. Isso muda completamente a lógica de controle”, afirma Löbel da Luz.
Na avaliação do especialista, o endurecimento das regras do MONITRIIP ocorre em um momento crítico, marcado pela dificuldade de implementação do Novo Marco Regulatório do transporte rodoviário interestadual, instituído pela Resolução ANTT nº 6.033/2023. Apesar de a norma estar em vigor desde fevereiro de 2024, ainda não houve a abertura efetiva de janelas de autorização para novos operadores ou mercados.
“Vivemos um paradoxo. Temos hoje um sistema de fiscalização digital com padrão próximo ao de sistemas bancários, mas seguimos sem novas autorizações. Mais de 500 dias se passaram e o placar continua zerado. Sem previsibilidade regulatória, as empresas não conseguem planejar”, analisa.
Outro ponto de atenção destacado por Löbel da Luz é o prazo de apenas 60 dias concedido pela ANTT para que as empresas se adaptem às novas exigências tecnológicas. Para ele, a medida evidencia que a digitalização deixou de ser opcional. “Quem ainda depende de processos manuais ou sistemas analógicos vai ficar para trás. A tecnologia virou o piso do setor, inclusive como instrumento de combate ao transporte irregular”, diz.
O especialista também chama atenção para o impacto econômico das novas obrigações. Com os custos de tecnologia integralmente arcados pelos operadores, somados à alta do diesel e à necessidade de renovação de frota, ele alerta para o risco de desequilíbrio econômico-financeiro do sistema. “A conta precisa fechar. Tarifas artificialmente comprimidas resultam em menos oferta e pior qualidade, o que acaba atraindo ainda mais regulação punitiva”, avalia.
Por fim, Löbel da Luz aponta a comunicação como um dos principais gargalos do transporte regular. Segundo ele, o setor tem dificuldade em explicar ao passageiro que o endurecimento do controle de dados tem relação direta com segurança e qualidade do serviço.
“Quem não comunica perde narrativa e abre espaço para o transporte clandestino, que é ilegal, mas sedutor. Em 2026, comunicar bem será tão estratégico quanto operar bem”, conclui.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes


