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Nova York elege prefeito que promete cidade “sem catraca, sem fome e sem despejo”


Zohran Mamdani vence eleição com propostas ousadas: tarifa zero no transporte, comida a preço de custo e aluguel social — e marca distância ideológica do trumpismo

ALEXANDRE PELEGI

Zohran Mamdani, 33 anos, ativista e deputado estadual até ontem, é o novo prefeito de Nova York. E trouxe com ele um cardápio de políticas públicas que parece mais saído de um manifesto que de uma planilha orçamentária: tarifa zero, aluguel social e comida sem lucro.

Três pilares que ele define como “as bases de uma cidade que volta a cuidar de quem vive nela — e não de quem especula sobre ela”.

O democrata socialista venceu a eleição de 4 de novembro com um discurso afiado contra o legado de Donald Trump e contra o que chama de “economia do medo”, que transforma necessidades básicas — comer, morar, se mover — em mercadoria de luxo. “Nova York não precisa de muros. Precisa de pontes, metrôs e mercados públicos”, repetiu nos debates, sempre em contraste direto com o populismo conservador que voltou a ganhar voz nos EUA.

Tarifa zero: o ponto de partida

Entre os três eixos da campanha, a tarifa zero foi o que mais empolgou. Mamdani defende transporte público gratuito como direito social e eixo de reorganização urbana: “Se o trabalhador gasta duas horas por dia e parte do salário só pra chegar ao trabalho, o sistema já falhou”.

A proposta é eliminar completamente a cobrança nas redes de metrô, ônibus e ferry, financiando o serviço com recursos do orçamento geral e tributos sobre grandes fortunas e imóveis ociosos.

Mais do que uma promessa de bilhete gratuito, o novo prefeito diz que quer mudar a forma como a cidade pensa mobilidade: “Transporte é o sangue da cidade; comida e moradia são o corpo. Tudo precisa pulsar junto.”

Comida sem lucro

O segundo pilar do seu programa parte de um raciocínio simples — e ousado: se a cidade compra comida em atacado, pode vendê-la ao mesmo preço.

A prefeitura passaria a operar uma rede de “supermercados públicos”, comprando alimentos em escala e revendendo ao povo sem margem de lucro.

A proposta mira em dois alvos: combater a insegurança alimentar e reduzir o custo de vida. Em bairros como o Bronx e o Brooklyn, onde os preços disparam e a renda média cai, o plano soa quase como um resgate. “Queremos que o tomate volte ao prato e não ao gráfico da inflação”, brincou Mamdani na noite da vitória.

Aluguel social e o direito de ficar

O terceiro vértice é o aluguel social, uma engenharia que transforma a prefeitura em fiadora solidária dos inquilinos.

O modelo é simples: o município garante o pagamento ao proprietário, e este, em troca, se compromete a reajustar o valor apenas pela inflação, e não pela especulação.

O programa promete evitar despejos, estabilizar bairros e reduzir deslocamentos forçados — conectando, de forma inédita, moradia e transporte.

Para o prefeito eleito, não há como falar em mobilidade urbana sem falar em endereço fixo e geladeira cheia:

“Se o aluguel expulsa, o ônibus não resolve. Se a comida falta, o metrô não leva ninguém adiante.”

Um contraponto direto a Trump

Mamdani venceu uma disputa marcada por discursos opostos ao trumpismo: enquanto o ex-presidente fala em “paredes e fronteiras”, o novo prefeito fala em “pontes, integração e redes”.

Sua vitória simboliza o avanço de uma geração de políticos progressistas que aposta em políticas públicas universais e estruturantes — menos ideologia de mercado, mais solidariedade cotidiana.

A imprensa local já chama o conjunto das propostas de “Plano 3C”: Comer, Casar (cidade e moradia) e Circular. Um trocadilho que ele mesmo aprovou: “Três verbos que sustentam qualquer cidade viva”, disse, rindo, na entrevista da vitória.

Transporte como costura urbana

O mote de sua equipe é “cidade interligada, não dividida”. O transporte, nessa lógica, deixa de ser apenas deslocamento e passa a ser o elo que conecta os outros direitos.

Sem tarifa, o ônibus vira extensão da moradia; o metrô leva ao mercado público; o deslocamento deixa de ser gasto e volta a ser encontro.

Economistas tradicionais questionam a viabilidade financeira do plano, mas os eleitores parecem ter respondido antes: preferem a ousadia ao conformismo.

E, como diz o próprio Mamdani, “ninguém paga pra respirar; por que pagar pra se mover?”.

Uma Nova York que quer voltar a ser cidade

O prefeito toma posse em janeiro e promete apresentar, nos primeiros 100 dias, o esboço do plano integrado de alimentação, moradia e mobilidade.

Entre o ceticismo do mercado e o entusiasmo das ruas, uma coisa é certa: Nova York se prepara para testar, outra vez, o limite entre o possível e o necessário.

Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes



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