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sem trilhos, sem baterias e com vida útil de 30 anos


Alexandre Pelegi, pelo Diário do Transporte e Podcast do Transporte, conversou com Gilson Santos (AMEP), Paulo Benites (CRRC Nanjing) e Cláudio de Senna Frederico (ANTP); modal elétrico sobre pneus, guiado por ímãs e alimentado por supercapacitores, será testado em linha metropolitana de 10 km entre Pinhais e Piraquara

ALEXANDRE PELEGI

Alexandre Pelegi, do Diário do Transporte e do Podcast do Transporte, conversou com três protagonistas diretamente envolvidos na chegada do Bonde Urbano Digital (BUD) ao Paraná: Gilson Santos, presidente da Agência Metropolitana do Paraná (AMEP); Paulo Benites, parceiro local da chinesa CRRC Nanjing; e Cláudio de Senna Frederico, consultor internacional e vice-presidente da ANTP.

As entrevistas integram o próximo episódio do Podcast do Transporte, que irá ao ar nesta quarta-feira, 17 de setembro de 2025, com produção de Luiz Henrique Romagnolli. O tema também estará em destaque no Arena ANTP 2025, congresso que acontece de 28 a 30 de outubro, no Expo Center Transamérica, em São Paulo.

O Paraná se prepara para colocar em circulação, de forma experimental, o Bonde Urbano Digital, modal inovador fabricado pela chinesa CRRC Nanjing. O veículo sobre pneus será testado em uma linha metropolitana de 10 km entre Pinhais e Piraquara, cidades vizinhas a Curitiba, nos próximos 45 dias.

O BUD combina guiagem magnética digital embutida no pavimento com propulsão elétrica via supercapacitores — componentes diferentes das baterias de lítio, que armazenam e liberam energia rapidamente e mantêm desempenho estável ao longo de sua vida útil.

Segundo Gilson Santos (foto acima), presidente da Agência Metropolitana do Paraná (AMEP) , a experiência é estratégica:

“Nós temos uma das maiores integrações de transporte coletivo entre cidades do Brasil. Mas precisamos avançar, porque o ônibus sozinho já não dá conta do crescimento da região metropolitana.”

O que é a AMEP

Criada pelo Governo do Estado, a Agência Metropolitana do Paraná (AMEP) é o órgão responsável por coordenar as funções públicas de interesse comum nas regiões metropolitanas. Isso inclui mobilidade e transporte coletivo, além de parcelamento e uso do solo, anuência de planos diretores, habitação de interesse social e meio ambiente.

“A AMEP é um órgão de apoio às prefeituras. Nosso papel é garantir que as cidades conurbadas se planejem de forma integrada, evitando, por exemplo, que um município faça um loteamento residencial numa divisa enquanto o vizinho autoriza uma indústria poluente. No transporte coletivo, essa coordenação é ainda mais vital, porque o passageiro não enxerga limites municipais”, explicou Gilson.

Onde o BUD vai rodar

O primeiro teste será em uma linha metropolitana de 10 km entre Pinhais e Piraquara, duas cidades coladas a Curitiba. Em 1 km do percurso será instalada a guiagem digital, com ímãs enterrados no asfalto, para validar a condução assistida.

“Esse é um dos corredores mais simbólicos da nossa rede, com cerca de 10 mil usuários por dia. Ao invés de colocarmos três ou quatro ônibus comuns, vamos inserir o BUD, principalmente nos horários de pico”, disse Gilson.

A tarifa será a mesma da integração metropolitana, R$ 5,50.

“Não faria sentido cobrar mais. Queremos mostrar que o transporte coletivo pode ser mais confortável e tecnológico sem pesar no bolso do passageiro”, reforçou.

Se aprovado, o serviço será estendido até o Terminal Capão da Imbuia, em Curitiba, e pode chegar ao eixo Norte–Sul da Linha Verde, corredor de maior demanda da capital.

Custos e ciclo de vida

O debate sobre custos é central. Para Paulo Benites (foto acima), parceiro local técnico e comercial e que está desenvolvendo o projeto em conjunto com a CRRC Nanjing, não se deve olhar apenas para o preço de compra, mas para o ciclo de vida do modal:

“O BUD foi projetado para durar cerca de 30 anos, como um veículo ferroviário. Já um ônibus elétrico, nominalmente, tem vida útil de 15 anos, mas a partir de 7 ou 8 anos já apresenta desgaste mecânico importante.”

Além disso, os supercapacitores (componentes elétricos que armazenam e liberam energia rapidamente, diferentes das baterias tradicionais de lítio) têm desempenho mais estável:

“Eles precisam ser trocados a cada 10 anos, mas mantêm a mesma capacidade ao longo do período. Não sofrem perda gradual como as baterias. A grande vantagem é que não se perde autonomia com o tempo.”

Benites destacou ainda a logística:

“Uma recarga completa garante autonomia de 40 km em 12 minutos. Mas, em apenas 2 minutos, já é possível recuperar energia suficiente para continuar a viagem. Isso simplifica a operação e reduz custos indiretos.”

Gilson reforçou a preocupação com sustentabilidade fiscal:

“Nenhum sistema de transporte coletivo sobrevive só com a tarifa. Mas precisamos de um modelo em que o subsídio caiba no orçamento público. O BUD pode ser esse equilíbrio, entregando qualidade ao passageiro sem se tornar insustentável para o Estado.”

Por que ele é “digital”

O BUD deriva do conceito DRT (Digital Rail Transit). Em vez de trilhos, utiliza ímãs embutidos no pavimento. Esses ímãs, com cerca de 2,5 cm de diâmetro por 5 cm de altura, são dispostos em sequência e funcionam como um “trilho digital”, transmitindo informação de posição ao veículo.

“A lógica é binária: polo norte e polo sul equivalem a zeros e uns. Isso gera um endereço absoluto ao longo do trajeto, permitindo que o veículo saiba exatamente onde está”, detalhou Benites.

Vantagens frente a VLTs e BRTs

A promessa do BUD é se situar entre o BRT e o VLT.

Em relação ao VLT, dispensa trilhos e obras profundas, o que reduz custos e acelera implantação.

Em relação ao BRT, oferece vida útil de 30 anos, contra cerca de 15 de um ônibus, além de uma “sensação de trem” ao passageiro.

“Queremos ir na contramão do que acontece hoje: em vez de perder usuários para o carro, atrair o motorista de volta ao coletivo. E só conseguiremos isso se oferecermos algo diferente, mais confortável e eficiente”, defendeu Gilson.

Cláudio de Senna Frederico (foto acima), consultor e vice-presidente da ANTP, reforçou a pertinência:

“Para sistemas de média capacidade, o trilho não é indispensável. É apenas um meio e não acrescenta por sí nenhuma funcionalidade. Em cidades em constante transformação, flexibilidade e prazo contam tanto quanto o aço do trilho.”

Para Benites, a possibilidade de condução sem a guiagem dá mais flexibilidade. por exemplo, caso haja um veículo com problemas a frente, “e também a facilidade de circulação em vias compartilhadas, o que faz com que o sistema possa ser implantado até gradativamente em vias de BRTs. Obviamente para maior eficiência uma via segregada é mais adequada, mas pode haver trechos ou mesmo períodos de implantação em que o compartilhamento será importante ou vantajoso”

Automação e sensores

O BUD opera hoje no nível GOA-2 (Grade of Automation 2, ou Nível 2 de Automação), que corresponde ao ATO (Automatic Train Operation, ou Operação Automática de Trens), sistema utilizado desde 1974 no Metrô de São Paulo. Isso significa que o veículo é capaz de se conduzir automaticamente, controlando aceleração e frenagem, mas ainda exige a presença de um operador a bordo, que pode assumir o comando em situações de emergência.

Equipado com LiDAR (Light Detection and Ranging, sensor que usa feixes de luz para mapear o ambiente em três dimensões), radar milimétrico (que detecta objetos próximos ao solo com alta precisão) e radar convencional (para medir distância de outros elementos na via), além de câmeras com inteligência artificial, o veículo consegue detectar obstáculos em 360 graus. A tecnologia é a mesma usada em carros autônomos.

“Esse é um modal complementar, não concorrente. Quanto mais opções tivermos, maior a chance de o cidadão deixar o carro em casa”, destacou Gilson.

Expansão e futuro

A AMEP já estuda usar o BUD em corredores metropolitanos de alta demanda, como Fazenda Rio Grande e Colombo. No interior, as cidades de Londrina e Maringá também estão no radar.

“A Região Metropolitana de Curitiba cresceu mais do que a capital pela primeira vez na história. Isso mostra a força do movimento pendular. Precisamos oferecer soluções sustentáveis para conectar essa população à capital”, afirmou Gilson.

Indústria local e escala

O contrato firmado com a CRRC é de inovação tecnológica, mas prevê parcerias locais caso o modal avance.

“A meta é uma base fabril no Brasil, preferencialmente no Paraná, em parceria com encarroçadoras nacionais. Escala é a chave, e o interesse que já vemos indica mercado suficiente”, disse Benites.

Conclusão

O Bonde Urbano Digital surge como uma solução intermediária, capaz de preencher o espaço entre o BRT e o VLT. Ao reduzir obras pesadas, apostar em energia limpa e oferecer uma experiência de viagem ferroviária, pode redefinir o transporte metropolitano brasileiro.

“O importante é garantir que não seja um elefante branco. Precisamos de dados do piloto para avaliar a sustentabilidade. Mas, se der certo, pode ser uma virada de chave para o transporte coletivo no Paraná e no Brasil”, resumiu Gilson Santos.

Cláudio de Senna Frederico concluiu:

“É a tecnologia que mais se aproxima de um VLT, sem a obra pesada de um trilho. Para cidades em transformação, pode ser a solução mais inteligente, especialmente se for integrado à indústria nacional.”

Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes



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