Publicado em: 6 de novembro de 2025

Em nota oficial, associação das empresas de transporte urbano reconhece a Tarifa Zero como política de justiça social — mas alerta que, sem fonte estável de custeio e pacto federativo, o risco é o ônibus da gratuidade ficar sem combustível
ALEXANDRE PELEGI
A Tarifa Zero, cada vez mais presente nas conversas sobre o futuro do transporte público no Brasil, ganhou nesta semana uma declaração de peso. A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) divulgou uma nota em que reconhece o valor social da gratuidade, mas faz um alerta: o entusiasmo precisa vir acompanhado de planejamento, governança e, sobretudo, dinheiro.
“A Tarifa Zero é uma importante medida de inclusão social”, diz a NTU logo na abertura do documento. “Permite que milhões de brasileiros, especialmente os de menor renda, tenham acesso ao trabalho e a outros direitos, como educação, saúde, alimentação e lazer.”
O tom inicial é de apoio — e não de resistência, como muitos poderiam imaginar. A entidade, que reúne as empresas operadoras do transporte coletivo urbano e metropolitano, assume o princípio de que o deslocamento deve ser um direito garantido, não um privilégio condicionado ao bolso.
Mas, logo em seguida, vem a freada:
“Sem definição clara das responsabilidades, sem fonte de custeio estável e sem garantia da qualidade do serviço, a Tarifa Zero pode se tornar inviável, especialmente nas médias e grandes cidades.”
A NTU propõe que a gratuidade universal seja construída de forma federativa, com União, estados e municípios sentando juntos no mesmo banco, dividindo responsabilidades e recursos.
“Defendemos que a Tarifa Zero seja resultado de um pacto federativo, com mecanismos transparentes de adesão e divisão de encargos.”
Outro ponto da nota busca equilibrar idealismo e realismo: para que o sistema seja sustentável, é preciso definir quem paga a conta — e garantir que o serviço não se degrade.
“Oferecer transporte gratuito e degradar o serviço não adianta. É preciso garantir qualidade, frequência e confiabilidade.”
A NTU também sugere que, antes da gratuidade total, as cidades possam adotar modelos graduais, priorizando públicos específicos:
“Podem ser contempladas crianças até 7 anos, idosos acima de 65, trabalhadores formais, estudantes, pessoas inscritas no Cadastro Único, entre outros.”
Na prática, seria uma “Tarifa Zero para quem mais precisa” — caminho já testado em algumas cidades pequenas e médias, onde o custo da operação é mais controlável e o impacto orçamentário menor.
O documento encerra com uma visão de longo prazo:
“O transporte público é direito social e deve ser tratado como política de Estado, com perenidade e estabilidade de financiamento, para que continue cumprindo seu papel de promover inclusão e desenvolvimento urbano.”
A NTU, portanto, não bate a porta da Tarifa Zero. Abre o diálogo — mas exige um mapa da rota. Reconhece que o transporte coletivo gratuito pode ser o motor de uma cidade mais justa, desde que o combustível do financiamento público esteja garantido e que o ônibus da esperança não quebre no meio do caminho.
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes


